quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Relatos de Mulher - Por que a depilação é um ato de auto violência?



Quando pequenininha, eu tinha como representatividade as mulheres que apareciam na mídia, seja na TV, em filmes ou revistas. Essas mulheres seguem um padrão rígido de feminilidade, que está intrinsecamente ligado ao ideal de beleza. Esse ideal vai desde o culto à magreza, cabelos longos, uso da maquiagem, e assim por diante. Mas os pelos corporais, que também são um fator importante desse ideal, parecem ser esquecidos quando o assunto “padrão de beleza” é discutido. 

Eu me pergunto, então, o porquê desse assunto ser tratado com certa naturalidade, quando existe uma evidente binaridade (mulheres sem pelo, homens com pelo) nessa questão. Considero importante, então, como mais uma ação para destruir esse ideal de beleza feminino, nos questionarmos acerca do que é a depilação feminina, descobrindo o que ela realmente representa. 

Primeiramente, o “não ter pelos” é uma imagem no coletivo social do que é a aparência de uma mulher. Ele coopera com a ideia tão difundida de uma mulher submissa e silenciada, por meio de atributos como a doçura e ingenuidade (afinal, pele sem pelos = pele de criança). Quando uma mulher se depila, sem pensar criticamente nesse ato, ela absorve essas características para si, aceitando o molde de beleza criado pelos homens. Em contrapartida, o “ter pelos” é uma imagem no coletivo social do que é a aparência de um homem. O “homem” é forte e viril, e essas características são atribuídas aos pelos. Tais imagens podem ser vistas, por exemplo, nos heróis de novelas musculosos. Dito isso, quando uma mulher passa a não se depilar e a mostrar os seus pelos, a ideia de feminilidade é imediatamente rompida. Afinal, aos olhos patriarcais, o que é ser mulher se não for para ser feminina e seguir o padrão? Vale lembrar que, enquanto para o homem a depilação é uma opção individual, seja ela estética ou não, para mulher é uma imposição e obrigação coletiva.


Ademais, a depilação, junto com o ideal de beleza, põe as mulheres em uma categoria homogênea. Segundo a regra, devem todas ter a pele depilada, e a diversidade física e genética é ignorada. Assim como o cabelo, que são literalmente pelos só que na cabeça, mulheres também têm pelos com características próprias em outras partes do corpo. Essa diversidade entre os pelos das mulheres vai desde cor, tamanho, formato ou textura. Tais características deveriam contribuir não só para a identidade visual, mas também para conhecimento e pertencimento ao próprio corpo.

Eu, por exemplo, tenho muito pelo. Eles são pretos, lisos e tem uma textura mais grossa devido ao uso contínuo de gilete ao longo dos anos. Até que aos poucos, fui parando de utilizar a gilete pelo sofrimento psicológico que ela me causava. Era como se meu corpo fosse uma floresta, meus pelos árvores e a gilete uma serra. O sentimento era de estar cortando e machucando a minha identidade. Até que os pelos (ou as árvores)  cresciam de volta. E aquela vida que estava mortinha dentro de mim, renascia.

Por isso mulheres, a depilação é um ato de auto-violência. É algo que nos é culturalmente imposto, e que aceitamos inconscientemente. Devemos nos questionar sobre os nossos pelos corporais e sobre o padrão de beleza (que dói!) imposto pela sociedade. E que, se for para se depilar, que seja por opção e conscientemente, e não por imposição. Para mim, aceitar os meus pelos foi um caminho para a auto-aceitação e o amor-próprio. Afinal, em uma sociedade que ensina uma mulher a se odiar, se amar é um ato de resistência! <3

Texto

Nome:  Malu Ramalho.

Cidade: RJ (porém, Paraibana)
Idade: 18 anos.



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