quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Um Tema, muitas ações - ENEM 2023

 


Como se não bastasse existir injustiças quanto ao assunto taxado como “serviços de mulher” , temos também que primeiramente reconhecer que ele é tido como inexistente para aprender a lidar com a indivisibilidade que ele carrega. O tema da redação do ENEM 2023, "Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”, não foi apenas genial, foi principalmente necessário. Os temas que movimentam as ações cotidianas precisam sair da caixinha de “assuntos inexistentes”, menos será possível combater a tal invisibilidade, e agir de maneira positiva diante dos fatos. Desse modo, pouco ou nada se muda ou transforma nas pessoas e consequentemente na sociedade. 


As dúvidas levantadas durante a abordagem do tema da redação do ENEM é de fato o que realmente importa, a pauta em si é o que tem valor para reflexões e transformações. Quando observamos as reações diversificadas, seja das pessoas que realizaram ou não, é possível compreender a dimensão do alcance deste tema, e enxergar nitidamente porque ele é tão necessário. 


É este debate que movimenta reflexões e novos caminhos de ações, faz com que as pessoas passem a olhar à sua volta de forma curiosa e pensem o que de fato mudou ou está mudando?  Por que isto está em pauta? A partir deste novo olhar gerado por um tema de redação, e questões observadas por seus filhos e filhas estudantes, novos movimentos se iniciam, e consequentemente as esperanças são renovadas. 


Também é preciso considerar que ao construir a narrativa na avaliação as pessoas se inspiram em algo ou alguém, e muitas vezes sentem que não haviam percebido tais “injustiças” antes de tal questionamento. Este fato contribui, entre outras coisas, para o fortalecimento entre as mulheres, além de reconhecimento por parte de todos os gêneros. Assim também acontece com quem não fez a prova, mas pensou sobre o que escreveria. 


Lógico que algumas (muitas) pessoas odiaram o tema, e se ver obrigados a pensar nisso, afinal esta invisibilidade é muito útil. E isso só prova o quanto este tema causou o que deveria, ou seja, desconforto. Quando não está incomodando, geralmente não está transformando. Compreender, praticar e se desafiar é uma das funções da educação e dos seus espaços. 


São muitos os pontos que favorecem a reflexão diante do tema abordado, entre eles está o fato de frases de efeito reflexivo serem espalhadas pelas redes sociais, citações como: “O que eles chamam de amor, nós chamamos de trabalho não pago”, Federici, Silvia. Entre outras que convidam a todos e todas uma uma nova reflexão e reconhecimento, este é o princípio do fim da invisibilidade e início da transformação 


Não necessariamente preciso discorrer o que penso sobre as avaliações de formato como as do ENEM e outros meios educacionais, este é outro ponto, afinal, a mudança se faz mudando, e se este é o sistema atual, que seja usado para o bem das necessárias transformações.  


Felicidade e gratidão foi o que eu senti ao saber sobre o tema, mesmo sabendo o quanto esta realidade é cruel e nos assola como mulheres, e nos atrasa enquanto sociedade. Mas eu sou muher, feminista e educadora, e sou também esperançosa, eu acredito. O fato é que acreditar na educação e nas pessoas é mais que falar ou escrever, é ação. O que fazemos com o que aprendemos, e o que somos capazes de mudar para transformar nós e o mundo.  


quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

469 de Sampa

Aniversário de São Paulo!  



Hoje, 25 de janeiro se comemora mais um aniversário de são Paulo. A terra da garoa, que nem garoa mais tanto assim, o chão do trabalho, que já não oferta como antes, o gigantesco espaço em que o transporte público vive lotado, e as ruas cheias de carro sempre. A cidade de pessoas apressadas e cara fechada, mas que também conversa em qualquer lugar que tiver oportunidade. São Paulo é um brilhar na sua imensidão de contrastes.

Quem disser que não gosta de São Paulo, bom sujeito não é... Nasci e fui criada em são Paulo, cresci aprendendo a curtir e odiar o meu lugar, sempre imaginando para onde ir e o que fazer longe daqui. Então comecei a pensar sobre o que me faz sentir esta dualidade pela tão famosa terra da garoa e não vi tanta dificuldade.

Me arrisco a dizer que, perceber que o mesmo povo que botou de pé tantos prédios e construções, e tantas outras estruturas majestosas é o mesmo povo não tão “bem” recebido por aqui. Mas a loucura maior é ver que São Paulo não é só de um ou outro povo especifico, é uma mistura de todos os cantos e não apenas do Brasil, o mundo todo está aqui.

 Não posso deixar de falar sobre um diferencial já antigo da cidade aniversariante de hoje, sabemos que é possível pedir qualquer tipo de comida, por exemplo, o que você estiver pensando neste momento, não importa a hora que estiver lendo este texto ou ouvindo estas palavras, é possível, mesmo que demore um pouco, você vai receber o que deseja. Ou seja, existem pessoas trabalhando, inclusive na madrugada para atender a quem quer que seja. São Paulo é isso.

Mas me pergunto se não é um pouco cruel alguém não dormir para que isso aconteça, ou pior, que esta pessoa não seja remunerada para tanto. Vai ver que é por isso que chamam São Paulo a “terra do trabalho”, porque as pessoas trabalham o tempo todo, recebendo o merecido por isso ou não.

No entanto, apesar desses altos e baixos a gente ama São Paulo também, aqui tem os melhores roles, as melhores comidas e os paulistanos, paulistanas e paulistanes sangue bom se perdem nas gírias mais engraçadas e divertidas. Vale lembrar que aqui a diversidade existe sem rodeios, a parada gay gira um comércio gigantesco, mas acima de tudo as pessoas existem de verdade.

A bem da verdade, São Paulo é aquele coração de mãe que sempre cabe mais um, e vamos nos adaptando e vivendo como a “cidade” direciona, no caso, as pessoas que vivem nela. E que bom seria se todos daqui tivessem um lar e afeto digno de uma mãe carinhosa e com condições de oferecer tanto.  

Vir à São Paulo para conhecer ou morar deve ser também para apreciar os melhores museus e suas grandes exposições, concertos, musicais, baladas, restaurantes, operas, saraus, arte de todo o tipo, cultura e amor. Ah sim, os paulistanos e paulistanas também amam! Eu garanto.

Em sua maioria as pessoas amam aqui, não é sempre que estão dispostos, mas quase sempre com pressa, por isso não consigo dizer se é um amor verdadeiro, ou apenas um costume que se perdeu na correria do dia a dia entre o trabalhar, estudar, cuidar do corpo e da mente, etc e tals.

É importante dizer que: Muitas pessoas por aqui gostam de estudar política, possuem ética e se preocupam com as pessoas, e amam esta cidade. Mas amar também é dizer o que não está tão legal, assim como uma mãe preocupada faz com os filhos.

Hoje São Paulo completa 469 anos, e muitas pessoas ainda sonham em viver aqui.

Então responda com honestidade. A aniversariante vem sendo acolhedora contigo a ponto de ser possível cuidar de você e aproveitar o sonho de viver aqui? Você considera que o tempo fez bem para a São Paulo e para os seus moradores?

O que será do futuro da nossa cidade se não começarmos a observar e executar as mudanças que ela precisa agora?

Estas são apenas algumas das provocações diante da cidade de São Paulo e de seus moradores, que na verdade são quem tornam este lugar possível do jeito que é.

 

Quanto a majestosa aniversariante do dia, ela continua em forma, mesmo depois de ter passado pela maior pandemia dos últimos tempos, apesar dos tropeços, a pele está bonita e saudável, só é preciso dar uma atenção especial a sua saúde emocional que não está em dia, afinal ela é reflexo daqueles que a tornam real. Cuidemos melhor da cidade e ela cuidará de nós.   

Parabéns, São Paulo!


Texto por: Grazy Nazario. 

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Quem é você na fila do pão?

 

Este é um bordão antigo, talvez seja cheio de significados e eu não tenho a menor idéia de onde tiraram esta frase, o que sei é que dá para viajar em suas variáveis definições, e não sei bem porque pensei que era exatamente o que eu sentia quando falava do momento atual do Brasil. 

Não precisa muito para imaginar que o assunto é política, sempre tem a ver com isso, como tudo no mundo, e em especial nas vésperas das eleições não seria diferente. O que dá para perceber quando olhamos um pouco de longe quem são as pessoas na fila do pão? Isso mesmo, pessoas comuns, buscando o pão de cada dia, mas quem de fato são essas pessoas, o que elas mudam no mundo e para si mesmas, e porque é tão importante elas saberem o seu lugar na sociedade?

Eu seria hipócrita se dissesse que se trata de pessoas sem valor, pois sou eu a primeira a dizer o quão valorosas são as pessoas e suas ações, e também sobre o poder de decisão de cada uma, e de como a autonomia é indispensável para se enxergarem do jeito que são: grandes e indispensáveis.

No entanto, muitos confundem isso com o tal “valor” diretamente ligado ao valor financeiro, como se fosse possível avaliar em espécie o valor de idéias, ações, enfim a vida de alguém. Entenda isso não é possível.

Quando apenas o lado financeiro é avaliado muito se perde, principalmente a analise filosófica da coisa toda, todo o valor se resume a dinheiro, e entende-se que quem não o possui não tem importância, logo, quem tem um pouco a mais se sente superior, e assim vamos “nos” classificando e se colocando em posições de classes, até que a classe social toma forma e quem tem mais está no topo da fama da “fila do pão”. Na verdade, vale ressaltar que quem tem mais não está na fila do pão, pois tem alguém lá por ela.

O fato é que todos que estão na fila do pão são trabalhadores(a) buscando o alimento, assim como a classe dos trabalhadores trabalha por seu sustento, não importa se você vai levar muitos pães, ou apenas dois pãezinhos, o fato é que se você trabalhar na bicicletaria do seu bairro ou na multinacional que fabrica bicicletas você estará vendendo a sua mão de obra, e você é da classe trabalhadora, ainda que tenha um salário 10 x maior que o rapaz da bicicletaria.

Eu assisti um filme uma vez (ou várias) que falava sobre essa coisa do trocar de classe, se chama “trocando as bolas”, o astro era o Eddie Murphi, aquele foi um dos filmes que deixaram claro para mim o que de fato acontece quando você é da classe trabalhadora, e como a mente de quem nunca precisou pegar a fila do pão funciona.

Não falaria jamais mal sobre a ambição e de possuir objetos de valor, que por algum motivo facilitam  nossa vida, é logico que ter dinheiro é bom, e consumir o que se deseja também. Mas até que ponto TER deve ser maior do que SER? Ser bondoso, respeitador, afetuoso, amoroso, generoso, humilde, sábio e etc. TER quando se fala em objetos apenas nos limita, e nos impede de enxergar além do material, e quando não existe equilíbrio entre o ter e o ser a pessoa passa-se a servir o dinheiro e não o contrário.

Pense o seguinte: Você está num deserto, com muito dinheiro, ouro, jóias e tudo mais de valor que exista fora dali. O que possui realmente de valor nessa situação? Ter dinheiro ou conhecimento que pode trabalhar a favor da sua sobrevivência e saída do local em si. Neste caso, com certeza você deveria deixar o que tem peso, e o saber é a única realidade que não pesa e ninguém lhe tira.

É este o valor que dedico a educação e tudo o que acompanha a evolução do ser humano, ter dinheiro e bens, e tudo o que ele é capaz de proporcionar é muito bom, mas sozinho, sem proposito não torna você diferente na fila do pão ou na sua própria existência. É preciso SER mais, para que o TER aconteça e a sabedoria acompanhe o que de fato vale a pena.

O meu sonho de saber é que TODAS as pessoas possam estar na fila do pão, seja com o carrão do ano, a pé ou de ônibus, a luta acontece para que ninguém fique sem seu sustento ou o seu pão de cada dia, e que de alguma maneira ninguém mais chore por sentir fome. Na fila do pão eu sou aquela que sonha e acredita que o bem pode vencer, e sonhos se realizar.  

Não podemos continuar a abastecer a fome de pessoas que não tiveram a mesma oportunidade para ter e manter o seu sustento, o egoísmo não pode vencer o amor, e o futuro é agora.  

Então eu pergunto: Quem é você na fila do pão?





Texto: Grazy Nazario. 

domingo, 24 de abril de 2022

Cada zona, um conforto


 

Pensar na zona de conforto e como se livrar dela é algo que sempre me preocupou, e me atrapalhou algumas vezes. Eu ficava preocupada se estava nela sem perceber, e se tinha me acomodado e deixado de lutar, e seguir rumo aos meus propósitos. Afinal você segue evoluindo, estudando, colaborando para o seu amadurecimento e das outras pessoas? É assim que eu me cobrava, quase sempre, e é dessa maneira que a busca pelo equilíbrio entre não se contentar com pouco, e não se perder da própria busca me mantém em alerta.

O fato é que costumo usar esta frase: não fique na zona de conforto, não se acostume com a infelicidade, e com os desprazeres, não deixe as suas vontades e desejos nas mãos dos outros. Principalmente quando falo com mulheres ou pessoas que sofrem algum tipo de insegurança por conta de “aprovações” externas, não é fácil existir sendo além do esperado.

Falar isso constantemente me ensinou que eu precisava aprender a ouvir, pois isso mostra novas perspectivas. Confesso que eu não era boa ouvinte, mas depois que percebi o quanto é possível aprender tenho gostado muito, é uma abertura para um novo mundo, aquele que não é o seu. Quando fazemos isso o nosso mundo diminui, e não de maneira pejorativa, mas de forma realista, o mundo não é o nosso umbigo, a força e energia que carregamos nem sempre está presente nas outras pessoas, e elas possuem percepções que não conhecíamos. Enfim, é riqueza, troca de amor e vida.

Sair da zona de conforto sempre pareceu fácil para mim, eu costumo ser aberta ás experiências, não tenho medo de arriscar e continuar de outra maneira. Mas o que isso tem a ver com sair da zona de conforto? NADA!

Esse tal lugar é muito louco, e dependendo de como você enxerga o mundo você nunca sairá de lá. Poderá praticar grandes aventuras, correr muitas maratonas e viajar o mundo, mas caso não se conheça bem jamais saberá o que é sair da sua zona de conforto, ficará falando pelos quatro cantos do mundo sem conhecer nada de si, e do que te atormenta, ficará tentando suprir as dificuldades em grandes feitos, mas não saberá onde está a simplicidade de se superar, de ser grande, e arriscar ser simples, apesar de tudo.

Cada zona tem um conforto diferente, sair da sua pode ser saber que se é pequeno quando assim se sentir, mas ter coragem para se movimentar, não sentir vergonha de “perder”, pois muitas é você quem ganha, e viver o hoje sem medo. É também ter vontade de chorar e fazer isso, e acreditar que é possível mudar, mesmo que a passos curtos, mas é acima de tudo é saber onde está aquilo que te fortalece e não se esquecer do caminho.

Eu continuo a temer estar na zona de conforto, mas entendo que tem muitas maneiras de estar nela, e formas de não estar também, assim como muitas vezes o pequeno é grande e vice e versa. Podemos admirar alguém que realiza grandes feitos por si, mas aquelas que também não enxergam outra saída e fazem o que está ao seu alcance para não parar, isto é também sair da zona de conforto.

 Não existe o meu certo e o meu errado, existe as pessoas e percepções de cada uma, e a libertação não é viver o que eu acredito, mas se libertar daquilo que te faz mau, e viver o seu BOM, a sua felicidade. Sair da zona de conforto é também esticar a mão a apoiar no caminho que a outra pessoa escolher, ainda que você não concorde, porque sair da minha zona de conforto é também entender que cada pessoa vê e sente a vida a seu modo.

O fato é que ser infeliz não é o caminho para ninguém ainda que pareça "confortável", não é. A dor acontecerá de toda maneira, então que seja para fortalecimento, grandiosidade e liberdade. Não é sobre aceitar tudo de qualquer maneira, não dá para ver os dois lados de tudo, porque a opressão é sempre opressão e gera dor, mas é sobre as limitações que possuímos, e reconhecer que elas existem, principalmente porque plantaram no mundo as inseguranças que aprendemos a conhecer, e que seja possível que todas também conheçam a própria capacidade, força e fé.  

É incrível saber que, sempre que ouço aprendo e me liberto da raiva que sinto por saber o quanto mulheres são oprimidas, e que muitas vezes elas ainda não sabem disso, e daí me recordo que isso não é culpa delas, e não serei eu a condená-las por aquilo que não as faz bem. Viver a perceber esta realidade não é nada confortável, mas é preciso respeitar, e aceitar a diversidade de seres que tanto dizemos que existe.

Para sair deste lugar vamos aprender, assim como os bebês aprendem a andar, um passo de cada vez, um depois do outro. É assim sempre, em cada nova ação, atitude ou decisão. Só não pare, use a energia de quando era criança e queria aprender, e a sabedoria de até aqui, não se anule, continue conquistando.

Quanto a sair da zona de conforto é muito bonito ver quando você faz de tudo para sair da sua, é lindo e inspirador, você inspira pessoas, você é grande, nunca se esqueça disso. Não desista da sua felicidade, do seu sorriso e do que te faz bem. E sempre que algo novo lhe chegar ao coração me chame, por favor, dívida comigo o grande feito, e eu prometo que farei o mesmo. Estarei em alegria, porque o amor é e sempre deveria ser maior que a raiva. Merecemos ser felizes.



Texto dedicado à aquelas que se arriscam. 

Grazy Nazario. 

terça-feira, 30 de novembro de 2021

A lição que fica - Marília Mendonça

 Perto de completar um mês da morte da cantora Marilia Mendonça, ainda é difícil imaginar como tudo aconteceu, o que poderia ter evitado a tragédia, e as fragilidades do viver em si. E fica difícil enxergar a lição de cada história. Foram cinco vidas, muitos planos, e diversos exemplos a seguir.



Há muitas imagens da trajetória de vida da Marilia Mendonça que nos remete a pensar que lição é possível aprender e realizar. A fragilidade evidente nos últimos momentos antes de sua partida é uma das que ainda me toca, o seu sorriso, a sua ultima refeição, tudo nos faz caminhar para reflexões diante da nossa vida. Fico a me perguntar: Como saber sobre o fim?

Quando será a nossa última refeição, a última vez que nos preocuparemos com as contas a pagar, um desejo de consumo, um problema de família... São tantas as agonias cotidianas atreladas a alegrias e realizações. Como separar o bom do ruim, evoluir e aproveitar os momentos com a intensidade que merece?

É interessante aprender isso ainda agora, e saber viver. Não pensar no ultimo dia, mas viver todos como se fossem o "ultimo" da maneira mais sadia que existe. 

Marilia é exemplo de muitas buscas, desde a carreira musical, realizações, pé na estrada, mudanças estéticas, maternidade, vivência na arte e na música. Não tem como dizer, para quem está olhando de fora, que ela não viveu intensamente os seus momentos. Seja em hábitos do dia a dia comum, ou com todo o seu glamour de artista. 

Mas nada nos "avisa" que está chegando o fim, ninguém nos diz: aproveita! Nem a última vez que vamos comer aquela saladinha na hora do almoço, muito menos a última gargalhada ou a última música cantarolada. É só mais um dia.  Sempre parece que a próxima cena virá. E creio que é proposital, ou viveríamos um caos na terra.

 

Além de artista, uma inspiração

 

Falar de Marilia Mendonça hoje transcende a questão musical, é falar de superação, sonhos, luta... A mulher é exemplo até depois que morre. Afinal, quem disse que você não pode ser feliz e realizar seus sonhos sendo mulher?

Eu não sou conhecedora de todas as suas letras, na verdade não sou muito fã de música sertaneja, mas sempre fui fã de mulheres como Marilia, que roubam o palco, a cena, e estremece a coisa toda.

Marilia está além do cenário musical porque não se trata só de música, mas de representatividade feminina, diante da sua vida, e de como é possível viver o que se tem vontade. Mulheres podem traçar um destino, e viver ele como tiver vontade de fazer isso.

 Marilia é especial. A contradição acontece entre a vida e a arte que ela canta e encanta nos palcos, em suas letras ela não tinha vergonha de expor o quanto somos vulneráveis diante das decisões do amor, por exemplo. Marilia não dizia: Deve-se ou não fazer isso ou aquilo, ela só dizia: É isso aqui que acontece, agora olha minha amiga, e veja se vale a pena seguir nessa vibe ou partir para outra!

Suas músicas não catavam como a condição social limita as mulheres, como as tornam inseguras, nem mencionava a criação de tudo isso. Ela ia para a realidade de hoje, o presente, é como um “tapa na cara” vindo daquela amiga que te gosta, quer te ver bem, e vai logo ao ponto. Em suas canções, Marilia diz o que existe do lado da mulher que está sendo traída, abandonada para que o parceiro fique no bar, ela descreve também como bate o coração de uma prostituta abandonada e descriminada por ser quem é, além da infiel, a romântica, entre outras.

 

O lado dela

 

O lado das mulheres representado por Marilia são muitos. Durante muito tempo todo o cenário musical era composto por homens, aos poucos as mulheres foram ocupando espaço, e cantando seus sentimentos, o que de fato sentia por si mesma. Mas quando falamos de música sertaneja, a demora foi maior, poucas mulheres conseguiram se introduzir e se manter, muito menos se consolidar. Não existia “simpatia” por aquilo que mulheres produziam, mas aos poucos esta realidade foi mudando.

Existe outro lado, mulheres sofrendo, pessoas que sentem e querem colocar este sentimento para fora, e até então não foram ensinadas a fazer isso. A tal “sofrência” também serviria para se libertar de algo ruim, a tal cantoria deixava as meninas mais calmas, elas se viam ali, não era sobre outras pessoas, mas sobre elas. E assim, como quem não quer nada, a vida de Marilia também não serviria de inspiração para perceber o quanto você merece por ser quem é. São possibilidades, opções que aprendemos a perceber a partir de suas mudanças e buscas, afinal, as suas transformações foram muitas, mas a sua essência permanecia ali.  

As suas letras são compostas no presente, Marilia nos faz sentir que vale a pena ser feliz, fazer o que sente vontade, ainda que, depois a gente se arrependa, e que veja ele “trocar de calçada”, ou que fique cantarolando o problema de “não casar”. Fato é que chegará o dia em que ele te mandará mensagens e você estará em turnê de shows com as amigas!  O que vale é a canção, se divertir, e ser feliz.


Fonte: Internet.  


A Partida

Infelizmente a tristeza de sua perda ainda é maior que seus ensinamentos, mas tenho certeza de que com o tempo isso irá melhorar. O simbolismo de sua partida feliz da vida, esperançosa, cuidando da voz, da saúde, acreditando no que ela merecia, sendo intensa com a vida que escolheu. Com o tempo daremos valor a estes sorrisos honestos, mesmo quando ainda não forem os últimos, nos desculparemos com as amigas, valorizaremos as emoções de estar com quem amamos, cantaremos o amor, vivendo cada pedaço que nos é possível.

Marilia voou e por lá ficou, a sua falta será tanta que chega a apertar o peito e encurtar as palavras. Ficaremos a imaginar por que tão cedo, e a torcer para que ela tenha tocado o coração de outras mulheres, que se inspirem e que tenham entendido a sua mensagem. A arte é um canto eterno.


Texto: Grazy Nazario

Pesquisar este blog