A cada dia surgem novos grupos exigindo mudança e respeito quanto aos direitos direitos das mulheres. Estão em todos os cantos, de idades diversas e classes sociais, e aos poucos se dão conta de que são os responsáveis pelas transformações sociais que interferem no cotidiano de cada um.
A EMEF Sérgio Milliet
localizada na zona leste de São Paulo é mais uma das unidades escolares que fala
abertamente sobre gênero e sexualidade. O assunto esta na boca de meninas e
meninos, a cada momento uma nova discussão, construções e desconstruções de
conceitos e culturas que a cada dia se transformam, e nos toca como algo
realmente importante.
Em visita a escola as
estudantes nos apresentaram o assunto que esta mexendo na rotina da escola, o
feminismo é a pauta. A ideia de igualdade torneia as meninas, e para orgulho de
professores e direção, a iniciativa partiu de um trabalho escolar. O TCA (Trabalho
Colaborativo Autoral), este trabalho faz parte da grade do ciclo autoral das
escolas Municipais de São Paulo. Os alunos escolhem os temas a ser trabalhado e
pesquisado, uma espécie de prévia para o TCC (Trabalho de conclusão de Curso)
que se tem conhecimento no ensino superior. Esta é uma forma de proporcionar
aos estudantes interesse e resultados a partir de pesquisas, e despertar o
interesse em assuntos de seu cotidiano.
O grupo do TCA da EMEF
Sérgio Milliet é formado por cerca de 15 garotas, que se sentem a vontade para iniciar
assuntos relacionado ao tema. “Não podíamos usar nenhuma roupa que tínhamos
vontade, fosse frio ou calor, nada era permitido para as meninas”, esta foi a
citação de uma das participantes, e segundo o restante do grupo, foi a partir
daí o interesse em falar sobre o assunto.
Em outros relatos as
reclamações são desde as mais simples às mais complexas, sobre comportamento,
expressões, até aborto, e atitudes que antes lhes pareciam normais, agora são insustentáveis.
O assédio dos meninos é um assunto muito mencionado pelas garotas, e também foi
algo que impulsionou o grupo, a força se tornou tão real a ponto de quase
causar a expulsão de um de seus colegas de sala. Diante das alegações de
assédio e toque ao corpo das adolescentes, além das famosas “cantadas”, e
tentativas de beijos forçados, a direção se sentiu na obrigação de tomar uma
atitude.
Algumas declarações são
realmente preocupantes, meio a palavras inflamadas: “Ele não respeita ninguém”,
disseram elas em coro. “Simplesmente diz que vai te beijar, e, e nos deixa com
medo”. “Um dia cercamos ele no pátio, todas nós juntas, ele ficou pálido.
Dissemos a ele que aquilo não estava certo, e que ele não poderia fazer isso
com ninguém. Exigimos que ele fosse expulso da escola.”
Quanto a este episódio
foi relatado que o menino pediu para ficar, e disse que mudaria a atitude. O
grupo entendeu que se ele apenas saísse da escola nada mudaria, e ele
continuaria a fazer isso em outras escolas, e com outras meninas. Se estava
pedindo uma chance, mostrariam a ele como deveria respeitar mulheres e garotas.
Fatos como estes deixa nítido
a importância de abordar estes assuntos, intervir com propriedades de leis e
direitos. O emponderamento das meninas é evidente, a esperança em mudanças, e o
saber que qualquer mudança se inicia em atitudes que rejeitam o senso comum, que
dentre muitas coisas implica em não aceitar atitudes como esta.
Outro caso contado com
empolgação, foi sobre o garoto que usava uma camiseta com frases ofensivas as
mulheres. Ele foi parado no pátio, e exigido que a ofensa escrita em sua
camiseta fosse retirada. “Se não podíamos usar uma blusinha de calor, como ele
poderia usar uma camiseta com frases que considerava as mulheres um mero objeto”.
Isto estava errado! Afirmou a estudante.
Diante de algo tão consistente
o colega voltou para casa com sua blusa de frio cobrindo a camiseta. Mas a intervenção
foi para que ele não a use novamente, mais que isso, entenda que combater o
machismo não é questão de opinião, mas de respeito ao outro, respeito ao limite
do corpo e da vida de outra pessoa.
As meninas já fizeram
algumas intervenções na escola, apresentações no pátio para os colegas, e conversas
nas salas de aula, além de pesquisas para o projeto em si. Mas a maior vitória
para o grupo até o momento é o fato de terem conquistado o direito de usar
blusa de calor e bermuda nos dias mais quentes. Pode parecer pouco, mas é
realmente revigorante sentir que fizeram parte de uma mudança, a alegria é simplesmente
encantadora.
O tema é amplo, envolve além de questões
machistas a ordem dos direitos humanos, e questões do ECA, as integrantes se
dizem a cada dia mais interessadas e motivadas, e as pesquisas e produção dos
textos respaldam as atitudes em torno das questões.
Além
dos muros da escola
“Na minha casa tudo
está diferente”. Esta fala é de todas as meninas. “Depois que começamos a falar
sobre os direitos das mulheres, começamos a ver as coisas de outro jeito”. Disse
Micaeli com o apoio das colegas. Este comentário foi sem duvida o que gerou
mais confusão durante a escuta, todas queriam falar ao mesmo tempo, como se um “mundo
novo” se abrisse, e novas perspectivas fossem possíveis, e hoje todas elas tem
certeza disso.
“Eu questiono as
pessoas, por que não concordo quando falam que algumas mulheres merecem ser
estuprada por seu comportamento”. “Ninguém merece ser estuprada!” Afirma Sara que
contribuiu para escrever um texto do TCA. “Eu defendo os nossos direitos, não
podem culpar a mulher por tudo”.
As garotas Naiara,
Karolina, Ana Camila, Bianca, Evelyn e Ariane falaram de alguns conflitos que
estão acontecendo com mais frequência em casa, como assuntos relacionados as
tarefas domésticas e de como isto tem sido problematizado. A Júlia contou como o futebol que tanto gosta de jogar passou a ser aceito de forma mais tranquila pela família, mesmo ainda sendo alvo de muito preconceito por parte dos meninos. Entre outras falas a
Vitória, Beatriz, Amanda, Giovanna Alves, Samira, Giovanna Viana e Carine falaram
também das questões de responsabilidades sexuais, e como isto ainda é um grande
tabu quando se fala da sexualidade das meninas, é ainda algo “proibido”.
Seja na fala das mais tímidas
ou das mais expressivas, cada uma a sua maneira se comporta como um grande
caldeirão de ideias e abertura ao conhecimento, naturalmente prontas para
aprender e ensinar com garra e vitalidade.
A finalidade do trabalho faz jus ao que se propõe, transformar a vida
cotidiana através de pesquisas e estudos, e conscientizar os estudantes de que
a sociedade somos cada um de nós.
As protagonistas do TCA
Feminismo da Escola Sérgio Milliet parecem perceber e nos mostrar que a escola
é muito mais que conteúdos a aprender, é troca, pratica e fonte de conhecimentos
múltiplos, é o berço da sociedade e suas funções reais.
A professora Mariana,
orientadora da turma, finalizou a visita com uma fala emocionante ao mencionar a
importância da dedicação das meninas, e como é gratificante participar deste
projeto que esta além dos muros da escola, esta na transformação de professores
e alunos, e em viver a esperança enquanto colhe a cada dia seus resultados.
Texto por: Grazy Nazario.
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