Supostamente na idade
de “aceitar” o mundo como está e pouco dizer ou interferir, adolescentes usam o
espaço escolar para além do raso significado determinado como um local de
conteúdos a aprender. O espaço social e de educação formal é também usado como
um ambiente de troca, de compreensão e de transformação social dentro e fora da
escola.
Estas são as pessoas
que também cuidarão deste planeta no futuro. Nada está perdido!
O grupo de estudantes da EMEF
Eduardo Prado inicialmente poderia ser chamado de Grêmio. Seria normal dizer
que jovens da escola que participam das atividades do conselho, opinam quanto
as prioridades da escola, e representam as vontades dos seus colegas, seja
denominado grêmio estudantil. No entanto, o grupo de predominância feminina
dessa unidade escolar, se autointitula um grupo feminista, não foram escolhidas
através de votos, mas se sentiram eleitas por necessidades maiores e de percepção
geral. Além de praticar as atividades que também poderiam ser de responsabilidade
de um grêmio estudantil, enfatizam a luta por igualdade entre os gêneros, e
problematizam questões essenciais para que a convivência escolar aconteça de
forma saudável.
O grupo principal é formado por
cerca de trinta meninas, este é um numero expressivo diante da propriedade e do
compromisso com que a turma trabalha as questões. A autonomia é visível desde a
construção do grupo em divisões de tarefas e determinações gerais, até a fala
de cada uma. É claro que existe a colaboração de um “adulto”, a presença e
apoio do corpo docente é essencial quando falamos de espaços escolares. Neste
caso, o professor Eduardo de língua portuguesa é o mediador e apoiador do
projeto que carrega o nome MOVIFEMI, Movimento Feminista na Escola.
Entre as motivações para a
criação do grupo estão algumas situações incomodas, e que muitas delas notaram
parecer irreversíveis, e dignas de intervenções. Segundo conta uma das meninas,
a primeira batalha vencida foi o uso da calça legging durante a educação
física. Embora pareça algo banal ou simples de resolver, a ideia de que elas não
deveriam usar a peça para não gerar “desconforto” para os meninos era, no mínimo,
ridícula e sem cabimento. Não existia desrespeito em usar uma roupa que
facilita as atividades físicas, existe desrespeito quando não se pode fazer
isso por que as outras pessoas não aprenderam a ter limites diante do corpo do
outro. Naquele instante foi percebida uma troca de valores, antes não notada, e
a partir daquilo nascia um grupo que se incomodaria com outras atitudes
semelhantes.
Conversando com as meninas nota-se
a liderança natural que elas possuem sobre as ideias e conceitos feministas,
mas não apenas isso, também fica claro a preocupação com as minorias diante de
qualquer natureza como racismo, homofobia, xenofobia, entre outras questões
preconceituosas. A partir deste viés, o grupo se mostra eclético em
personalidades, o que garante abordagens diferentes respeitando a personalidade
de cada garota, e levando em consideração como cada pessoa se enxerga e encara
a própria sexualidade.
Os assuntos discutidos pelo grupo
são diversos, vão desde falta de produtos específicos para as meninas como
absorventes, passando por roupas, comportamento e condutas machistas em geral.
O ideal é que seja algo do cotidiano, acontecendo e atrapalhando de algum modo
a vida ou a liberdade delas, seja no
espaço escolar, na internet, televisão, ou na rua, o importante é se incomodar
com isso, e buscar soluções.
As duvidas são consideradas algo
natural e enriquecedor no grupo, esta é outra característica forte nas meninas
do MOVIFEMI, varias questões são levantadas pelas colegas e problematizadas
primeiramente entre o grupo, e muitas vezes compartilhadas em sala de aula. O
importante é não deixar dúvidas, buscar fontes de pesquisas, e neste momento,
mais uma vez o professor é um aliado e contribuinte.
Um dos trabalhos realizados pelo grupo
A organização é outro componente
que acrescenta qualidade, o grupo MOVIFEMI se divide para falar com as turmas,
a liderança é algo distante, pois o grupo se transparece em respeito mutuo de
ideias e conceitos. Uma das integrantes é presidente do conselho da escola, e a
sua fala transborda segurança quanto aos próprios direitos. A mesma percepção
se espalha pelas outras integrantes, umas mais tímidas, outras mais falantes,
mas todas em prol do mesmo objetivo.
As atividades não param em discursos
ou reuniões no conselho da escola, as meninas criam cartazes sobre o tema,
poesias, textos, entre outros, além de participarem das redes sociais também fazem intercambio em outras Unidades
Escolares, afinal o assunto não é novidade e esta a cada dia mais em alta.
Produziram um manifesto (que estará disponível no final da matéria), assim como
os endereços eletrônicos.
As meninas Beatriz Cavalcanti,
Beatriz dos Santos, Brenda, Bruna, Gabrielly, Giovanna, Isabela, Larissa,
Marcela, Mayza, Renata, Poliana, e Thais, Junto ao professor Eduardo estiveram
durante o nosso bate papo que não apenas rendeu esta matéria, mas também uma gigantesca
troca de conhecimento. O grupo não se encerra entre elas, existem outras
pessoas da escola e de períodos diferentes que também são engajadas, e que se
reúnem diante de qualquer necessidade, inclusive com a participação de meninos
(mesmo em minoria), a voz e ouvido dos meninos é também considerado importante
para melhores resultados.
Diante de atitudes como a do
MOVIFEMI fica mais perto do real acreditar na mudança das pessoas e nas melhorias
da humanidade, toda força coletiva possui melhores resultados, e tudo aquilo
que é feito com qualidade e compromisso alcança os seus objetivos. Muitas
meninas estão no seu ultimo ano na EMEF Eduardo Prado, mas já se preocupam com
a continuação do MOVIFEMI portas adentro da escola, pois já sabem das
dificuldades de se manter conquistas diante de uma verdade cultural diferente,
a luta acontece todos os dias para alcançar e manter direitos.
Esta claro que a escola não é
apenas um espaço de conteúdos, mas de grandes aprendizados sociais, está nela a
base de qualquer construção social, é dentro dos muros das escolas que aquilo
que conhecemos fora se inicia. Que a semente da igualdade se espalhe, a cada
dia é preciso maior consciência diante dessa realidade.
Texto: Grazy Nazario.
MTB. 74588/SP
Manifesto elaborado pelo MOVIFEMI
Manifesto em defesa de uma escola sem preconceito e discriminação
Mediante reunião realizada no inicio
de abril de 2015 com pauta relacionada a situações de preconceitos, observados
tanto dentro quanto fora da escola, verificou-se a necessidade de construir
espaços de debates, formação e organização de combate aos diferentes
preconceitos e discriminações decorrentes em nossa sociedade.
1 – Não tolerar nenhum tipo de
opressão relacionada a discriminações raciais, homofóbicas e machistas no
interior da escola. Com orientações especificas de como atuar em situações do
tipo.
2- Estabelecer um coletivo de
formação permanente visando conscientizar o coletivo da escola com o objetivo
de superar as situações de discriminação.
3 – Encaminhar debates para que
esta pauta integre todos os documentos oficiais da escola: Projeto Político
Pedagógico e Regras de Convivência.
São Paulo, 28 de Maio de 2015.
*A unidade escolar EMEF Eduardo Prado é uma escola Municipal
de São Paulo, pertence ao colegiado da Diretoria Regional de Educação Itaquera.
Agradecimentos ao Diretor da Escola Sidney Aparecido da Silva, e ao Professor
Eduardo que gentilmente cederam o espaço e nos convidaram a conhecer o grupo, e
também as meninas que contribuíram com seus relatos.
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